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Ouro Preto

sábado, 6 de junho de 2009


Sonhos


Era uma vez um homem que sonhava. Sonhava tanto e tão intensamente que se transformava, ele próprio, no objeto de seus sonhos. Foi assim desde pequenino, quando sua mãe e sua avó se acostumaram a encontrar pela manhã, no berço, em lugar do menino adormecido, um coelhinho, uma mamadeira ou uma bola de manchas azuis.

Quando o homem que sonhava se casou, a primeira coisa que fez foi sentar-se à beira da cama de casal e dizer à sua mulher: comigo acontece isso, isso e aquilo.

- Bem, disse a mulher, a gente se acostuma a tudo, quando há sinceridade e afeto.

No início ela até gostou, pois era excitante acordar no meio da noite e descobrir a seu lado, um enorme sapato com cordões desamarrados, um ramo de flores reluzentes de orvalho ou um unicórnio de crina azul celestre. Mas o homem começou a ter pesadelos e uma noite foi despertado pelos gritos da mulher.

Não houve jeito de fazer com que ela lhe contasse em quê havia se transformado dessa vez. Então ele decidiu procurar uma solução para o problema e foi consultar um tio que era médico, mago e inventor.

- Ora, não se preocupe! Eu vou lhe dar umas pílulazinhas que você deve tomar todas as noites e garanto que a questão se resolve.

As tais pílulas eram quadradas, transparentes como gotas de chuva e, o mais extraordinário, continham um minúsculo homenzinho adormecido. Cada vez que o homem sonhava, era o homenzinho que se transformava na matéria do sonho.

Desde esse dia, a mulher pôde descansar tranquila. No entanto, um mês depois, era ele que tinha adoecido.

- Antes, dormir era maravilhoso - dizia ele. - Agora eu passo as noites com a cabeça vazia: meu sono é como uma televisão sem imagem.

Então foi a vez da mulher ir consultar o tio médico.

- Prefiro enlouquecer a ver o meu marido sentir-se como uma cesta vazia.

O tio sorriu e deu-lhe uns tapinhas nas costas:

- Quando há confiança e amor, se encontra a solução para tudo.

E deu-lhe um pequeno frasco de pílulas triangulares, transparentes como gotas de água, em cujo interior giravam espirais de vapor cor de anil.

- Tome uma antes de se deitar e diga a meu sobrinho que suspenda o tratamento que lhe receitei.

Desde essa noite o homem voltou a sonhar e a transformar-se num sapato gigante, num ramo de flores, num unicórnio de crinas azuis... mas sua mulher nunca mais acordou sobressaltada, porque sonhava que era o pé que calçava o sapato, o vaso que segurava as flores ou a amazona de olhos cor do mar que, sem rédeas, cavalgava o unicórnio.

Joel Franz Rosel


Para o dia dos Namorados -Cristina.

2 comentários:

  1. Cristina: Apreciei o conto do literato cubano Rosell, que você postou. É preciso compreender e captar bem a mensagem que está contida nestas entrelinhas e isto só acontece com pessoas que tem boa sensibilidade; uma destas é você!
    Abraços...

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